Conforme amplamente noticiado, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela inconstitucionalidade da cobrança do Diferencial de Alíquotas (“DIFAL”) do ICMS nas operações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto.
Em breve síntese, segundo o STF, em que pese haja previsão constitucional (EC 87/2015) para sua instituição, o DIFAL apenas poderia ser efetivamente cobrado pelos Estados caso existisse Lei Complementar que regulamentasse a cobrança.
Como sabemos, antes da EC 87/15, o ICMS nas operações interestaduais destinadas a consumidores finais era devido integralmente ao Estado de origem. Naquele momento, alguns Estados, inclusive, aderiram ao chamado “Protocolo 21” e passaram a exigir o DIFAL nessas operações por conta própria (sem autorização constitucional, sem previsão em Lei Complementar e sem Convênio Confaz). O Protocolo 21, embora claramente inconstitucional, foi um marco da Guerra Fiscal no país e criou um ambiente de completa insegurança jurídica, além de denunciar que a tributação concentrada na origem estava na contramão da tendência de tributação em outros países.
Para resolver o imbróglio, instituiu-se a EC 87/15, a partir da qual passou a existir expressa previsão constitucional de que as operações destinadas a consumidores finais seriam tributadas como operações interestaduais, devendo ser recolhida a alíquota interestadual na origem e o DIFAL para o Estado de destino.
No entanto, em que pese o CONFAZ tenha editado Convênio para regulamentar a referida Emenda Constitucional, o STF decidiu que isso não bastava e que seria imprescindível a edição de Lei Complementar sobre o tema. Na prática, o DIFAL é constitucional, mas não pode ser cobrado antes da existência de Lei Complementar.
Ainda assim, para preservar a economia dos Estados e propiciar segurança jurídica, o STF validou a cobrança do DIFAL sem Lei Complementar até 31/12/2021. Por isto, houve uma intensa movimentação dos Estados no Congresso Nacional para aprovação do Projeto de Lei Complementar regulamentadora do DIFAL (PLP 32), o qual, em 16/12/2021, foi aprovado pela Câmara dos Deputados.
Ocorre, entretanto, que, embora o Projeto tenha sido aprovado no Congresso Nacional ainda no ano de 2021, a sanção presidencial apenas ocorreu em 2022, sendo que a Lei Complementar nº 190/2022 apenas foi publicada no DOU em 05/01/2022.
Com isto, inicia-se um novo capítulo do Contencioso Tributário: é que, a partir de 01/01/2022, nos termos da decisão do STF, o DIFAL (sem Lei Complementar) passou a ser inconstitucional e inexigível, de modo que apenas pode ser cobrado após a edição da Lei Complementar aprovada no Congresso e desde que respeitados os princípios constitucionais tributários.
Nesse contexto, alguns Estados já se manifestaram no sentido de que uma vez sancionada e promulgada a Lei Complementar, podem passar a exigir – de imediato – o DIFAL nas operações interestaduais destinadas a consumidores finais.
A questão, entretanto, é polêmica: é que toda lei que represente uma instituição ou majoração de tributos (como é o caso) deve respeitar os princípios constitucionais da anterioridade anual e da anterioridade nonagesimal, isto é, as leis só poderão valer a partir do exercício seguinte ao de sua promulgação, respeitados os 90 dias desde a sua edição. Inclusive, tanto a Lei Complementar editada quanto algumas legislações estaduais já promulgadas trataram da anterioridade nonagesimal (90 dias), mas nada trataram a respeito da anterioridade anual. É o caso do Estado de São Paulo que editou a Lei nº 17.470/2021 respeitando o prazo de 90 dias para que entre em vigor.
Nesse contexto, considerando que a Lei Complementar nº 190/2022 só foi efetivamente promulgada a partir da sanção presidencial e publicação no DOU em 05/01/2022, há bons argumentos para sustentar que ela apenas produzirá efeitos a partir do ano de 2023 em observância à anterioridade anual.
Ainda assim, segundo posicionamento recente do Comitê Nacional de Secretários da Fazenda (COMSEFAZ), os Estados insistem em defender que a edição da Lei Complementar não equivale à criação ou majoração de tributos, mas apenas à regulamentação do imposto com previsão tanto na Constituição quanto no Convênio CONFAZ, razão pela qual não haveria necessidade de observância dos princípios constitucionais acima tratados.
Ocorre que a Constituição não cria tributos (apenas permite que os Estados o façam) e o Convênio CONFAZ é inconstitucional (como decidido pelo STF), inexistindo fundamento de validade para cobrança do DIFAL antes da Lei Complementar nº 190/2022.
Com isto, há uma oportunidade para que os contribuintes questionem a cobrança do DIFAL em todo o ano de 2022.
Fonte: Dessimoni & Blanco Advogados